28/07/2015

Meditações bíblicas sobre a Eucaristia

Por Pe. Luís Alonso Schökel, sj
 
As meditações I e II foram publicadas em VIDA PASTORAL, no nº 132 (janeiro-fevereiro de 1987, pp. 27-35); as meditações III e IV no nº 133 (março-abril de 1987, pp. 26-35).

VOFERTÓRIO — EUCARISTIA — BERAKÁ-1
Hoje devo explicar a parte que chamamos ofertório, que significa ou designa a oferta dos dons. Vou explicar esta seção ampliando-a em duas direções. Primeira, remontando a práticas e expressões bíblicas; segunda, comentando o texto atual do ofertório, embora me obrigue a incursões em outras partes da missa.
O texto atual é: “Bendito sejais, Senhor Deus do universo, pelo pão (pelo vinho) que recebemos da vossa bondade, fruto da terra (da videira) e do trabalho do homem, que agora vos apresentamos, e para nós se vai tornar pão da vida (cálice da salvação)”. Algumas vezes se realiza com condução processional do pão e do vinho ao altar, outras vezes se reduz ao gesto do sacerdote elevar os dons. Em algumas ocasiões outros dons acompanham o pão e o vinho.
O texto é uma bela síntese da celebração que em grego chamamos eucharistía, em português ação de graças,em hebraico beraká. Começarei expondo sem pressa o termo hebraico.

1Beraká. Uma exposição histórica estudaria formas litúrgicas judaicas e analisaria seu influxo e desenvolvimento em fórmulas cristãs. O estudo foi realizado por especialistas. Em espanhol contamos com a erudita exposição de J. M. Sánchez Caro, Eucaristía e historia de salvación (Madrid, 1983). Minha tarefa é muito mais modesta e se limita ao Antigo Testamento; isto talvez me permita uma contribuição útil pelo menos para a meditação.
É bem sabido que a liturgia judaica usava fórmulas de ação de graças que chamamos beraká ou birkat-, diferenciadas segundo o momento do banquete. Beraká é, portanto, uma fórmula, e seu equivalente cristão é a anáfora. Mas beraká no AT é algo mais, designa também o dom.
A raiz hebraica brk, especialmente na conjugação piel (barek), costuma ser traduzida por bendizer. Mas énecessário diferenciar a tradução. Fundamentalmente, o verbo implica duas pessoas e um bem de uma delas. A bênção de A refere-se a um bem com relação a B. Se não o possui, a bênção é desejar-lhe que o obtenha; se já o conseguiu, é felicitá-lo por isso. Um amigo nos diz que vai submeter-se a exames, e nós lhe desejamos boa sorte, êxito: o abençoamos. Mais tarde o encontramos e nos comunica que teve êxito, e então o felicitamos. Ambos os conteúdos podem ser percebidos no verbo brk, segundo as ocasiões.
Diz um provérbio hebraico: “Quem saúda o vizinho de madrugada e em altas vozes, é como se o amaldiçoasse”. “Saudar” é brk, e é desejar-lhe um bom dia. Dar bom dia procede da velha fórmula que, completa, soava assim: “Bom dia nos/vos dê Deus”: é desejar um bem ao outro para toda a jornada, bendizê-lo. Nós, brasileiros, desejamo-nos “tudo de bom”. Essas fórmulas podem degradar-se em simples saudação cortês, em convenção social. A uma saudação de despedida parecem referir-se Gn 47,10 e Ex 12,32. O sentido de felicitar pelo bem conseguido está claro em 2Sm 8,10: “Mandou seu filho Adoram ao rei Davi, para o saudar e o felicitar (brk) por ter feito a guerra a Adadezer e o ter vencido”.
Quando a outra pessoa nos fez um favor, nossa bênção é antes uma ação de graças: bendizemos = damos graças. Com isso entramos em nosso terreno; por isso será útil citar alguns exemplos: “Se for um pobre… ao pôr do sol deverás devolver sem falta o penhor, para que ele durma com o seu manto e te abençoe” (Dt 24,13a). “Se vi um miserável sem roupas, um pobre sem cobertor, e não me agradeceram os seus flancos (brk), aquecidos com a lã das minhas ovelhas” (Jó 31,19-20). “Joab caiu com o rosto em terra, prostrou-se e bendisse o rei” (2Sm 14,22a).

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