16/10/2015

Monasticismo Oriental e Ocidental Pioneiros do Monasticismo Pe. Inácio José do Vale*

Santo Antão (c. 251-356)

ormou seus primeiros discípulos, que decidem renunciar ao mundo e se agrupar em torno dele. Desta época - que podemos situar aproximadamente em 305 - data de fundação da primeira comunidade cristã no Egito. Ainda não é um mosteiro, mas, no máximo, uma laura, um agrupamento de anacoretas, submetidos a uma ascese e a um modo de vida relativamente livres. Esta primeira comunidade, Antão a estabelecera às margens do Nilo, não longe da fortaleza de Pispir, perto da atual aldeia de Deir-el-Maimum.

Santo Antão, portanto, é o fundador da vida monástica primitiva individual. Faleceu no dia 17 de janeiro de 356, com 105 anos.

São Pacômio (c. 290 - c. 364)

Fundador do monasticismo copta. Depois de viver 12 anos com um eremita ele também funda seu primeiro mosteiro por volta de 318 situava-se perto da aldeia de Tabenesi, na margem ocidental do Nilo, nas proximidades da antiga cidade de Denderah.

A obra monástica de São Pacômio foi estupenda, sete mil monges estavam sob seu controle direto no Egito e na Síria. Todos eram tomados por uma profunda simplicidade, obediência e devoção.

A sua organização monástica ficou conhecida como tipo comunal ou coletivo de monasticismo cenobítico. São Pacômio tinha o dom divino da administração. Sua obra serve de exemplo até hoje.

Comunidade Monástica

«O mosteiro é um céu terrestre e, assim, nós devemos ser como anjos», escreve João Clímaco autor ascético do século VII.

O mosteiro, no seu simbolismo essencial, é uma representação reduzida da Cidade celeste. É por isso que é rodeado de muralhas que o isolam do mundo externo, semeado de flores e de plantas como no jardim do Éden. Os jardins, as fontes dos mosteiros como uma evocação do paraíso. «É possível avaliar o simbolismo das igrejas e dos jardins dos mosteiros», escreve Mircea Elaide num capítulo de seu livro Mythes Rêves et Mystères. «A paisagem que envolve o monge reflete o paraíso terrestre de alguma maneira ela o antecipa.» Na tradição do deserto, basta acrescentar simplesmente: o paraíso terrestre e celeste.

A vida monástica aconteceu muito antes do cristianismo.

Um célebre rabino (o nome é desconhecido) que permaneceu solteiro, justificava o seu celibato com esta frase: «Que posso fazer? Toda a minha alma pertence à Torah. Que os outros perpetuem a raça humana!»

Grandes nomes do Antigo Testamento ficaram solteiros em prol da vocação e chamada de Deus para o ministério profético. Elias, Eliseu, Jeremias e Daniel ( Jr. 16.1,2).

Tanto Flávio Josefo como Filo de Alexandria falam com bastante entusiasmo de um grupo judeu religioso especial; e Plínio, o Velho, quer tenha lido a respeito deles em Filo ou tido ele mesmo conhecimento deles na Palestina, homenageia esses judeus com um longo parágrafo no capítulo cinco de sua Naturalis Historia. Era do conhecimento comum então, que este grupo, esta «terceira escola de filosofia judaica» como Josefo a chama, as outras duas sendo a dos saduceus e a dos fariseus, tivesse o seu centro geográfico na região de En Geddi, junto ao Mar Morto, e que ali, reunidos em comunidades de oração, «sem mulheres, sem amor, sem dinheiro, apenas com as palmeiras por companhia», vivessem homens que sujeitavam a uma disciplina excessivamente severa e que eram indiferentes a tudo exceto o que se referisse a Deus.

O nome pelo qual tais homens eram chamados variava de acordo com o autor que escrevia sobre eles. Filo usou o termo Essaioi, esseanos, vendo nisto um equivalente de hosioi, ou homens piedosos. Josefo escreveu Essenoi, essênios; e os etimólogos discutiram quanto à expressão derivar-se de esah, um partido, ou de hasid, hasidim, os piedosos.

O indivíduo juntava-se à Comunidade (este termo usado pelos próprios essênios) depois de passar por um exame e um período duplo de experiência, primeiro de um ano e a seguir, dois. O novo membro entregava todos os seus bens à Comunidade, jurava obediência «à regra e aos seus superiores», declarava sua intenção de «separar-se dos iníquos» e viver em verdade, justiça e caridade. Depois de aceito como membro era obrigado a praticar várias abluções diárias, usar um traje de linho branco, comer apenas vegetais, observar os ritos da purificação ritual ainda mais escrupulosamente do que os fariseus, talvez falar em hebraico e não aramaico, e finalmente enterrar seus excrementos. Mas acima de tudo, devia participar das refeições comunais de todos os irmãos e orar com eles em horas regulares e nos dias santos de festa.

As comunidades essenciais achavam-se divididas em três categorias: sacerdotes, levitas e leigos. Elas ficavam sob a direção de um chefe, um presidente, o Mebagger, e debaixo deste, um conselho central, uma espécie de capítulo com doze membros, que tratava de todos os assuntos importantes, particularmente o castigo dos membros que desobedecessem às regras; o chefe supremo era o Mestre da Justiça. Mulheres não eram admitidas. «Ninguém nascia entre os essênios» - parece porém, provável a existência de comunidades femininas que obedeciam às mesmas regras: foram encontrados esqueletos de mulheres em Cunrã.

Crianças postulantes podiam ser aceitas, recebendo uma educação especial. Fora das verdadeiras comunidades havia provavelmente essênios solitários que levavam seu ascetismo a maiores extremos, como vemos ainda hoje eremitas no Monte Atos na Grécia, vivendo em cavernas junto aos monastérios cenobíticos até morrerem. Josefo fala de um deles, Banous, que «habitava no deserto, vestido com tangas fornecidas pelas árvores e vivendo do que podia colher.» Esta descrição nos faz imediatamente lembrar de João Batista; e como o lugar de seu apostolado, o vau de Betsabara no baixo Jordão, ficava a poucas horas de Cunrã, é possível que ele também fosse um desses essênios solitários. Mais afastados do Mar Morto, haviam sem dúvida simpatizantes do essenianismo, possivelmente uma espécie de terceira ordem de essênios, que viviam no mundo ma conformavam-se à regra o mais possível.

O essenianismo era um credo espiritualmente elevado, o qual ficamos conhecendo através de várias obras encontradas entre os rolos: a Regra da Comunidade e o Manual da Disciplina dizem respeito principalmente ao estabelecimento dos regulamentos do grupo, mas os Salmos da Nova Aliança, a estranha e bela Guerra entre os Filhos da Luz e o s Filhos das Trevas e alguns comentários sobre certas passagens da Bíblia, particularmente extraídas de Habacuque e Miquéias, nos oferecem uma clara compreensão do ensino dos essênios. Ele segue a linha mosaica mais estrita: só existe meio de buscar a Deus, e esse é a Lei. Deus exige obediência absoluta dos membros da comunidade à Torah, devido a uma «nova aliança» que é uma graça divina. É, portanto, dever dos filhos da Luz lutar contra os perversos, os defensores do diabo, os Filhos das Trevas. Isso é necessário, além de tudo, porque dois espíritos antagônicos sempre dividiram entre eles a humanidade pervertida pelo pecado. A alma é imortal para os essênios, pois ela existe antes do corpo ser formado e depois de sua morte vota ao lugar transcendente de onde veio. No final dos tempos, haverá um Juízo Final, quando os homens da perdição serão destruídos e os predestinados, chefiados pelos membros da comunidade, entrarão na glória de Deus.

O Paraiso Terrestre

Desde o início do Cristianismo, muitos cristãos, homens e mulheres, começaram a atender este chamado do Senhor, deixavam dinheiro, parentes, se abstiam do casamento, passando a ter uma vida exclusivamente para Deus, em silêncio, em oração e trabalhando na confecção de cordames, cestas e esteiras, e com isto conseguiam os meios para a sua subsistência. Mt 19.12; Lc 2.37; I Cor 7.7. Este tipo de vida é chamado de vida eremítica, ou eremetério (de eremus deserto), isto é, vida solitária, no deserto, e teve seu início no século III, em regiões do Egito, Palestina e Síria, tendo como exemplo Santo Antão.

Como esses cristãos viviam só para Deus, longe do mundo, passaram a ser chamados de «monges», palavra que se origina do grego «monachós», que significa que aquele está só, que vivem só para Deus. O lugar onde os monges viviam, em comunidade (comunidade monástica) tomou o nome de «monastério», em grego, donde «mosteiro», em português. «Assim mosteiros surgiram no meio das montanhas e o deserto se povoou de monges, de homens que tinham renunciado a todos os seus bens e dado o seu nome para a cidade dos céus», palavras do historiador Roland Fröhlich (Curso Básico de História da Igreja, Edições Paulinas, São Paulo, 1987).

A vida eremítica foi cedendo, aos poucos, à vida cenobitica ou comunitária. Os monges passaram a viver em comunidade urbanas, submetidas a uma regra e a um superior, chamado «Abade» (pai); a regra visava a regulamentar a disciplina dos monges na oração, no trabalho, no vestiário, e na alimentação. Os cenobitas levam a vida contemplativa (oração) e comunitária, servindo à comunidade, e o primeiro organizador da vida cenobitica foi São Pacômio, que, além de fundar mosteiros masculinos, fundou dois femininos, cada um com uma superiora, chamada abadessa.

As vidas de Pacômio e de seu discípulo Teodoro abundam em episódios onde se vê o chefe reprimir sem cessar essa ostentação na ascese. Eis um exemplo significativo: as refeições aconteciam uma vez por dia, num refeitório onde se serviam aos monges ervas cozidas, frutas, pão e água. Se um monge quisesse jejuar, só podia fazê-lo no refeitório, e era freqüente ver este ou aquele monge levantar-se da mesa sem ter tocado em sua refeição. Situação que se tornou intolerável, pois bastava que um monge se abstivesse ostensivamente de comer para que os outros se sentissem culpados e se acusassem de serem muito frouxos em sua ascese. A tal ponto que, finalmente, ninguém mais ousava comer. Para remediar essa inconveniente, Pacômio imaginou fazer os monges usarem um capuz bastante amplo para que cada um pudesse cobrir com ele o seu prato e comer ao abrigo dos olhares indiscretos, sem ele mesmo saber o que se vizinho fazia. Assim, durante as refeições comuns, todos os capuzes baixados se tornavam, no sentido próprio como no figurado, um testemunho de humildade!

Fora da Vida cenobítica para humildade ser praticada existiam várias asceses e ascetas. Os pastadores (consistindo em alimentar-se de ervas, raízes, até mesmo em caminhar de quatro e viver «como um bicho»), dos estilitas e dos dentritas (que viviam sobre colunas ou sobre árvores e «regrediam» ao estádio vegetal) e dos estacionários, que permaneciam imóveis, no meio da multidão, sem se mexer, sem falar, sem sequer erguer os olhos. O asceta torna-se, então, uma espécie de estátua humana.

O monasticismo teve o seu berço no Oriente e a principal regra monástica foi escrita por São Basílio Magno, que a dividiu em dois grupos: 55 Regras Maiores e 319 Regras Menores. Foi merecedor do título de «O Legislador do Monasticismo Oriental.»

O Monasticismo Ocidental começou sob a forma eremítica e sob a inspiração de Santo Atanásio, que escreveu a vida do primeiro eremita, Santo Antão. Os ocidentais, contudo, dotados de senso prático e ativo, preferiram a vida cenobítica.

Quatro santos se destacaram no Monasticismo Ocidental, tendo, cada um, escrito sua regra monástica: Foram: São Martinho de Tours, Santo Agostinho, São Columbano e São Bento de Núrcia. Este é o Patriarca dos monges do Ocidente. Destes, a primazia coube a São Bento que em 529, fundou a Ordem dos Beneditinos, a primeira grande ordem religiosa do Ocidente.

São Bento deu à sua comunidade conventual uma Regra, a qual se tornou a base de todo o monasticismo ocidental. Ela é composta de 73 artigos ou capítulos. Moderada no tocante à vida ascética, a Regra está cheia de instruções práticas. Enquanto os monges orientais se alimentavam mal, Bento prescrevia duas refeições diárias, constantes de dois pratos (de frutas ou legumes) e vinho. O sono reparador também é regulamentado e fixado em seus a oito horas. Os monges têm sua coberta e seu travesseiro. Por outro lado, a Regra é rígida em dois pontos: o monge deve permanecer por toda a vida no mosteiro em que fez os votos, a não ser que o abade o envie para outro mosteiro; além disso, o monge deve obediência irrestrita ao abade. Com a primeira das exigências, Bento deu estabilidade à vida monástica, eliminando a figura do monge ambulante. Com a segunda, instaurou nos conventos o conceito da paternitas. O abade é o pai, a quem se deve obedecer e o qual orienta seus filhos. No governo do mosteiro, o abade é auxiliado pelo prior.

Não há dúvida de que São Bento foi uma grande figura de monge da antigüidade. A vida monástica ocidental teve seu início com ele. Foi abade e declarado padroeiro principal da Europa, em 1964, pelo Papa Paulo VI, reconhecendo, assim, a grande colaboração do santo na civilização européia.

São Bento nasceu em Núrcia, em 480. Quatro anos antes do seu nascimento foi assassinado o último Imperador romano; a sobrevivência da cultura romana só foi possível através do trabalho incansável, no campo religioso e cultural, dos monges.

A regra monástica que São Bento escreveu se resume em três palavras: «Ora et labora»; «ora e trabalha», que quer dizer que os seus monges deviam levar vida ativa e contemplativa.

O verdadeiro monge, segundo a regra de São Bento, deve ser: «Não soberbo, não violento, não comilão, não dorminhoco, não preguiçoso, não murmurador, não detrator... mas casto, manso, zeloso, humilde e obediente».

São Bento quis que seus monges fossem absolutamente pobres. Roupas, comida, terras, instrumentos de trabalho: tudo é propriedade da ordem. O monge nada tem de seu. Aqui se estabelece uma ordem de vida coletiva. No entanto, a principal atividade dos monges beneditinos é a oração. São prescritas horas de oração individual e de culto comum. Seguindo as palavras do Salmo 119.164: «Sete vezes no dia eu te louvo» e do Salmo 119.62: «Levanto-me à meia-noite para te dar graças», são prescritos oito cultos diários: sete durante o dia e um à meia-noite. O culto da «meia-noite» era celebrado de madrugada, do que derivou-se para ele o nome Vigilia ou Matina. A ele seguiam-se os demais: Laudes, Prima, Tertia, Sexta, Nona, Véspera e Completas. Nessas horas de culto aconteciam a recitação dos salmos e a leitura de partes da Escritura. No espaço de uma semana eram recitados todos os Salmos. As leituras bíblicas seguiam o ano litúrgico. Desse costume brotou um profundo conhecimento bíblico nos conventos. Nos conventos de inspiração beneditina não se conhece a «era das trevas», mas uma profunda devoção bíblica. Os mosteiros beneditinos passaram a ser, ainda, centros de estudo, nos quais se copiavam e preservavam manuscritos. Ponto de partida para a atividade copista foi a própria vida de culto da ordem. Os textos bíblicos que eram cantados e lidos tinham que ser copiados. Aos poucos começou-se a copiar também outros textos. Assim, os mosteiros transformaram-se na Idade Média, em centros nos quais se preservava a cultura escrita da Antigüidade.

A importância da leitura e do canto fez dos mosteiros centros de alfabetização. Os monges foram, de fato, os professores do Ocidente cristão. Mais tarde, as universidades brotaram dos mosteiros.

São Bento faleceu no mosteiro de Monte Cassino por ele fundado, no dia 21 de março de 574, com 67 anos de idade.

Seu pensamento: «Nada colocar acima do amor de Cristo» (4,21 RB).

Os apotegmas coptas que são curtas sentenças ou frases pronunciadas pelos ascetas, evitando assim as conversas. O mosteiro passou a ser lugar de silêncio, contemplação, oração, jejum, louvor, estudos e trabalhos.

Nos piores momentos das guerras religiosas e civis, havia almas que elevavam a Deus os mais válidos protestos orando-lhe, invocando-o meditando os seus mistérios. «Crede-me, meus filhos» - dizia um monge a João Moschus, que cita estas palavras no Pré spirituel, o Prado espiritual -, «crede-me: nenhuma outra coisa na Igreja tem causado os cismas e as heresias senão o fato de que nós não amamos plenamente a Deus e ao nosso próximo.»

O retrato mais exato e mais saboroso da espiritualidade que brota da vida monástica, encontramo-lo já citado Pré spirituel de João Moschus; mais que a História laustica de Paládio ou História de monges de Rufino, esse livro tão espontâneo e tão pitoresco ainda toca as almas modernas. Nascido por volta de 550, provavelmente em Damasco, e falecido por volta de 619, talvez em Roma.

«O monge, portanto, é alguém que procura tão intensamente a Deus que está pronto a morrer para poder vê-lo. Por isso é que a vida monástica é um martírio» bem como um «paraíso», uma vida ao mesmo tempo «angélica» e «crucificada». «O mosteiro é uma escola onde se aprende de Deus a ser feliz» (Thomas Mertom, monge Trapista)

São Basílio Magno

Cerca do ano 330, em Cesaréia, na Capadócia, nasceu Basílio. Sua família era nobre e rica, mas sobretudo brilhava pela reputação cristã de virtude e zelo. Seu pai, Basílio, exerceu com grande competência a profissão de retor e advogado em Neocesaréia. Sua mãe, Emília, uma capadócia, era filha de um mártir e irmã de um bispo. Basílio foi um dos dez filhos nascidos deste consórcio; Gregório de Nissa e Pedro de Sebaste, seus irmãos, se tornaram bispos; Macrina, sua irmã, cognominada a Jovem (por oposição à avó, Macrina, a Antiga), retirou-se com a mãe para a solidão e aí vivendo a vida monacal procuravam a Deus, após a morte do pai.

Decorria logicamente de tal ambiente de família a sua formação cristã e bíblica. Basílio veio a conhecer quase de cor a Bíblia, que amava profundamente; era-lhe o livro por excelência.

Iniciado em Neocesaréia, por seu pai, nos rudimentos da ciência humana, chegou à idade de freqüentar as escolas; primeiramente em Cezaréia, onde conheceu seu compatriota e futuro amigo Gregório, mais tarde bispo de Nazianzo; em seguida, em Constantinopla ouviu os sofistas e os filósofos (Libânio, por exemplo); depois, já com mais de vinte anos, acompanhou os brilhantes cursos da tradição helenística, em Atenas, que, apesar de decadente política e economicamente, continuava a capital da eloqüência e atração para todos os jovens desejosos de se celebrizarem. Aí estreitou sua amizade com Gregório, animados ambos pelo mesmo zelo no estudo e na fidelidade a Cristo e à Igreja. São Gregório Nazianzeno nos descreve São Basílio estudante, contando com que esforço, interesse e entusiasmo aplicava seus dotes de inteligência e memória não só à gramática, à história, à métrica e à poesia, mas também à retórica e a todos os ramos da Filosofia, à astronomia, à geometria, à aritmética. Sempre com o equilíbrio que o caracterizará. Aprendeu também da medicina tudo o que possui um cunho doutrinal e filosófico. Enfim, sua competência em psicologia e moral o torna superior a Minos e Rhadamente. Basílio e Gregório puseram tudo em comum e se entretiveram freqüentemente sobre a «filosofia cristã», como então se chamava a vida de renúncia e ascese.

Antes, porém de abraçar a vida monástica, São Brasílio decidiu conhecer a vida monacal visitando os célebres mosteiros do Egito, da Palestina, da Síria e da Mesopotâmia, entretendo-se com os mais reputados eremitas da época.

Essa viagem encheu-o de santo entusiasmo: «Admirei», escreverá mais tarde, «a vida destes homens que demonstravam carregar realmente a morte de Jesus Cristo em seu corpo, e aspirei imitá-los tanto quanto possível.» Voltando de sua viagem monástica, entregou-se à vida ascética.

Renunciou às riquezas, honras, à sua posição social eminente, à sua reputação já notória de eloqüência e cultura. Vendeu seus bens, deu o dinheiro apurado aos pobres, e retirou-se para a solidão com seus companheiros, perto de Anesói, no vale do Íris, na margem oposta àquela em que sua mãe e sua irmã viviam. Oração, reflexão e estudo alternando-se com o trabalho no campo, eis a vida nova de Basílio. Gregório, o seu grande amigo, o futuro bispo de Nazianzo, veio também viver aí, mas não pôde ficar, em parte por causa de seu pai envelhecido, em parte talvez por desejo de maior atividade apostólica, como se pode deduzir de suas cartas a Basílio. Foram compostas «regras e cânones» tirados da Sagrada Escritura para a vida do grupo; nada ainda das depois chamadas Regras Mais Extensas e Menos Extensas, pois além dos mandamentos imutáveis de Deus, concernentes à vida cristã e contidos na Bíblia, a vida de comunidade organizava-se empiricamente: - a vontade do superior era legislar à medida das circunstâncias, pelo menos durante alguns anos. E assim foi.

Instado por Anfilóquio, bispo de Icônio, na Licaônia, e por muitos outros discípulos e admiradores, desejosos de terem por escrito o que Basílio expunha tão admiravelmente em suas homilias, preces e conferências, decidiu ele escrever o «Tratado sobre o Espírito Santo»; era o dia 7 de setembro de 374, festa do santo mártir Êupsico. Em fins de 375 estava pronto e publicado. Por outro lado, o sofrimento moral e a angústia que experimentava diante das infindáveis divisões provocadas pela heresia e suas conseqüências o levam a retomar por escrito a defesa do dogma da Santíssima Trindade e da moral e da ascese cristã.

No entanto, sua influência sempre crescente, ciência e eloqüência não permitiriam que Basílio ficasse por muito tempo em sua comunidade monástica. Foi o que aconteceu: Eusébio, eleito bispo ainda catecúmeno, embora piedoso e rico, não tinha experiência teológica; julgando-se pouco capaz para o governo de uma diocese, teve a sábia idéia de chamar Basílio para junto de si, conferindo-lhe a ordenação sacerdotal e fazendo-o seu conselheiro.

Com a morte de Eusébio em 370, Basílio foi eleito para sucedê-lo, não sem oposição da parte de alguns prelados. Tudo o habilitava para assumir o pesado cargo de bispo de Cesaréia e metropolita da província da Capadócia.

Não abandonou, entretanto, as comunidades monásticas do Ponto. Fez vir monges a Cesaréia e colocou a serviço da Igreja.

Em Cesaréia edifica num terreno, um grande hospital, que logo toma as proporções de uma cidade, chamada por seu nome, Basilíada, a qual compreende, além do hospital, uma escola de artes e ofícios, um orfanato, uma hospedaria, e um leprosário.

Escrevia: «A quem fiz justiça conservando o que é meu? Diga-me, sinceramente, o que lhe pertence? De quem o recebeu? Se cada um se contentasse com o necessário e desse aos pobres o supérfluo, não haveria nem ricos nem pobres.»

São Basílio, o grande Doutor da Igreja morreu no dia 1o de janeiro de 379 com 49 anos de idade. Considerado por todos o Apóstolo de Caridade.

São Basílio é o Patriarca dos monges do Oriente.

O Monasticismo Bizantino

O monasticismo bizantino - diferentemente do professado na Europa Ocidental - não possuía Regras ou Ordens pré-fixadas. Cada monastério tinha sua própria constituição, geralmente elaborada quando de sua fundação. Esta normalmente refletia as intenções do fundador, com freqüência um leigo ou leiga.

Os sexos não eram necessariamente segreados, nem se definia a autoridade do superior. No século V, São Basílio de Cesaréia sugeriu reformas, a fim de organizar e tornar mais efetiva a vida monástica. Segundo ele, os monges deveriam viver em comunidades onde os bens seriam comuns e todos obedeceriam à autoridade de um superior eleito. Todos deveriam orar, trabalhar e executar serviços de natureza social.

Daí em diante, foram fundados monastérios basilianos, ou cenobitas, em proporções cada vez maiores. Alguns deles localizavam-se em regiões longínquas, outros nas proximidades ou mesmo no interior das cidades, onde havia maiores oportunidades para a prestação de um serviço social efetivo. Justiniano I usou de sua autoridade imperial para legislar a respeito dos monastérios, dando-lhes alguma uniformidade legal. Todos os monastérios deveriam seguir o modelo basiliano. Os monges deveriam abrir mão de todos os seus bens antes de ingressar no monastério, onde teriam uma vida absolutamente comunitária. Qualquer pessoa poderia tornar-se monge, ou uma monja, em qualquer idade, a menos que se tratasse de um escravo foragido ou de um funcionário governamental que ainda não tivesse completado seu tempo de serviço. Pessoas casadas precisariam obter o consentimento do cônjuge. Em tais casos, era comum que ambos fizesse seus votos simultaneamente. Ele, ou ela, teria que passar todos os seus bens às mãos dos legítimos herdeiros antes de efetuar os votos definitivos. O noviciado tinha a duração de três anos, após os quais se faziam os votos finais de castidade, pobreza e obediência.

O abade, chamado de higumene - líder - aou archimandrite - chefe do rebanho - era eleito por voto de maioria entre os monges. Mas sua eleição tinha que se confirmada pelo bispo local. Quando da fundação de um novo monastério, o bispo inspecionava e abençoava o local escolhido e aprovava os títulos de propriedade. Após isso, os monastérios eram regidos por uma administração absolutamente autônoma, e o abade gozava de completa autoridade, desde que obedecesse às exigências dos títulos de propriedade. Estes eram dois: o brevion, que indicava as dotações e deveres litúrgicos requeridos pelo fundador, e o typicon, que especificava os direitos e as obrigações especiais dos monges. Por vezes, exigia-se que o monastério dirigisse um orfanato, escola ou hospital, ou que fornecesse um capelão à família do fundador. Apenas uma pequena parcela dos monges era composta de sacerdotes, mas se o abade não fosse sacerdote por ocasião de sua eleição, teria que ser ordenado. E era preciso que houvesse um número suficiente de sacerdotes no monastério para que os serviços religiosos fossem realizados regularmente. O abade era assistido administrativamente pelo ecônomo, que cuidava dos bens mundanos do mosteiro, pelo chartophylax, que funcionava como escrivão, e pelo bibliophylax, o bibliotecário - pois exigia-se que cada monastério contivesse uma biblioteca. Nos estabelecimentos femininos, a abadesa gozava do mesmo controle absoluto, com uma assistência semelhante. Mas neles o bispo fornecia capelães para ministrarem os serviços religiosos.

O bispo gozava de autoridade sobre os contactos exteriores do mosteiro. E ele poderia intervir em caso de algum escândalo grave dentro de suas paredes. Os bispos eram escolhidos dentre os monges. Até hoje.

Conclusão

A vida monástica é a doce sublime realidade celestial na terra. É a mais alta expressão do amor ao bom Deus e ao nosso semelhante. No monge encontra-se a mística abissal e a graça do testemunho de santidade. É no monasticismo que achamos a mais alta qualidade da espiritualidade da santíssima fé cristã.


*Padre Inácio José do Vale é pároco da Paróquia São Paulo Apóstolo e Professor de História da Igreja na Faculdade de Teologia de Volta Redonda - E-mail: pe.inaciojose.osbm@hotmail.com
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